AVANT SUPERMERCADO - CAXAMBU

AVANT SUPERMERCADO - CAXAMBU
AVANT SUPERMERCADO - CAXAMBU

domingo, 28 de outubro de 2012

Documento Histórico - Livro de Fulgêncio de Castro sobre Caxambu - 1873

 Livro de Fulgêncio de Castro sobre Caxambu - 1873
Transcrição do texto original
Colaboração: Pepe

Vista parcial do Parque antes da construção do balneário atual



G U I A

PARA UMA VIAGEM ÁS

AGUAS MEDICINAIS DE CAXAMBU

PROVÍNCIA DE MINAS GERAIS

Acompanhada de uma

BREVE  NOTÍCIA

Sobre a povoação

E um

ESBOÇO HISTÓRICO DAS MESMAS ÁGUAS

Pelo

Coronel Fulgêncio de Castro


Rio de Janeiro
Tipografia de Hipólito José Pinto
Rua da Quitanda n.31
1873





DEDICADA

À SUA MAJESTADE

O IMPERADOR

O SR. D. PEDRO II









por seu  muito reverente súdito

Joaquim José Fulgêncio Carlos de Castro


AVISO PRELIMINAR


                O tenente-coronel João Evangelista de Souza Guerra, residente na cidade de Baependi, fornece com presteza meios de condução que haja mister a viajante para ir a Caxambu, ao primeiro aviso que lhe for dirigido. Os preços estabelecidos, e relativamente os mais cômodos, são os seguintes:

Liteira convenientemente preparada,
da Boa Vista a Caxambu................................60$000
Cavalgadura arreada......................................15$000
Animal para carga .........................................10$000

                Corre por conta do passageiro o sustento dos tangedores e dos animais somente na ida ou na volta.
                Na estação da Boa Vista pode-se obter esses meios de transporte recorrendo-se ao Sr.Benjamin Luiz Duprat, morador na fazenda Três Pinheiros à distância de poucos quilômetros. A retribuição está assim taxada:

Liteira com 2 parelhas para
Conduzir 2 pessoas...................150$000 por viagem.
Dita com 1 aparelho para
Conduzir 1 pessoa......................100$000    ˝        ˝
Banguê para 1 pessoa...............  80$000     ˝
Cavalgadura arreada ..............  15$000     ˝         “
Animal para carga.......................10$000 por viagem
Camarada para acompanhar.....   5$000       ˝
               
O viajante paga as despesas dos animais durante a viagem de ida e volta, assim como o aluguel do animal que conduz o camarada.

* * * * *

VIAGEM

                Partindo da estação central da Estrada de Ferro de D. Pedro II no trem das 6 horas da manhã, o viajante chega a da Boa Vista (outrora Major Corrêa) a 1 hora e 50 minutos da tarde.
                No hotel da Boa Vista dá-se-lhe refeição, custando o almoço 1$500 e o jantar 2$000 e importando para os criados ou fâmulos o 1° em 1$000 e o 2° em 1$5000.
                Quem pernoitar nessa hospedaria paga mais 1$000.
                Vinho, bebidas espirituosas e artigos de luxo não se compreendem naqueles preços.
                O viajante ao chegar a Boa Vista dispuser sem demora da precisa condução, pode ir pernoitar no “Palmital” a 2 léguas (13 quilômetros e 200 metros) despendendo 1$000 por pessoa, 500 réis por criado e 1$000 pela cama. Os animais têm pasto gratuito.
                Deixando este hotel às 5 horas da manhã pode o viajante ir almoçar no “Engenho da Serra” a 2 léguas (13 quilômetros e 200 metros).
                Neste hotel, onde a cozinha é excelente, os preços são iguais aos do precedente, e há as mesmas acomodações para os viajantes e seus animais.
                Nesta parte da Serra do Picú o frio é intenso e até certo ponto incômodo quando cai garoa  (chuva finíssima e muito fria, quase sempre acompanhada de vento).
                No terreno adjacente ao hotel foi descoberta uma fonte mineral, cuja natureza e propriedades acham-se descritas no Anexo I.
                Continuando a viagem depois do conveniente repouso,  e passando pelo arraial de S. José do Picú, onde há três pequenos hotéis, o principal dos quais é o Midões, e pelo de Capivari, pode o viajante pernoitar no hotel Rendez-vous des Voyageurs a ½ légua (3 quilômetros e 300 metros) de Capivari, ou a 4 léguas (26 quilômetros e 400 metros) do Engenho da Serra.
                Os preços e acomodações aqui não diferem dos precedentes.
                Saindo deste lugar às 5 horas da manhã subsequente, e passando pelo importante arraial de Pouso Alto, onde há um bom hotel, e pela povoação do Sengó, o viajante almoçará no pequeno mas bem asseado e bem servido hotel do Alto da Boa Vista a 3 1/4 léguas (21 quilômetros e 450 metros) do ponto de partida, e continuando na jornada 1 hora depois do almoço, chegará a Caxambu, com 2 ¾ léguas(18 quilômetros e 150 metros) de caminho, às 4 ou às 5 horas da tarde.
                Em todos os mencionados hotéis a mesa consiste ordinariamente em feijão, ervas, arroz, carne de porco ou vaca, galinha, ovos, biscoitos de polvinho e pão (raras vezes).
                O vinho quase sempre de inferior qualidade é caríssimo.
                O milho consumido pelos animais do viajante constitui despesa especial.
                Os animais podem ser recolhidos em estrebarias se a viagem chegar ao pouso a hora, em que seja possível fazer-se provisão de capim, que pagará a 500 réis por carga.


ITINERÁRIO  Nº 1

                Primeiro dia da Corte pela Estrada da Ferro de D.Pedro II à Estação de Boa Vista e dali em cavalgadura ao Palmital.

Léguas 2;
Quilômetros: 13
Metros: 200

                Segundo dia do Palmital ao hotel “Rendez-vous des voyageurs”

Léguas: 6;
Quilômetros 39;
Metros: 600.

                Terceiro dia do  hotel a Caxambu:

Léguas 6;
Quilômetros 39;
Metros: 600.

Total:
Léguas:14;
Quilômetros: 92:
Metros: 400

                Estas viagens são regulares até para liteira, mas não obstante, podem ser alteradas, subdividindo-as pelos pontos intermediários de uma à outra pousada, que ficam notadas precedentemente como pontos de parada para almoço.
                No intuito de facilitar aos viajantes, que não tiverem conhecimento do caminho, a subdivisão das jornadas, que mais lhes convier, passamos a indicar as povoações e lugares mais notáveis entre Boa Vista e Caxambu.    

Quadro das povoações e lugares mais notáveis entre a Boa Vista e Caxambu com as respectivas distâncias.

Província do Rio de Janeiro.
-Da Boa Vista (Major Corrêa a João Maciel).
Léguas:11/2.
Quilômetros: 9.
Metros: 900.

- De João Maciel ao Palmital
Léguas: ½
Quilômetros: 3
Metros: 300

- Do Palmital a Lapa
Léguas: 1/2
Quilômetros: 3
Metros: 300

Limites
- Do Registro do Picú ao Engenho da Serra
Léguas: 1
Quilômetros: 6
Metros: 600

Província de Minas Gerais
- Do Engenho da Serra a João Pinto (*)
- De João Pinto a São José do Picú
Léguas: 1
Quilômetros: 6
Metros: 600

- De São José do Picú a Capivari
Léguas: 11/2
Quilômetros: 9
Metros: 900

- De Capivari ao hotel Rendez-vous
Léguas: 1/3
Quilômetros: 2
Metros: 200

- Do hotel Rendez-vous a Pouso Alto

                Os viajantes com liteira e bagagem pesada, que tiverem pernoitado na Boa Vista, poderão regular suas jornadas por este Quadro, devendo porém notar que não encontrarão pouso nos lugares com (*).
                Neste caso as jornadas mais cômodas e seguras são as constantes do

ITINERÁRIO N° 2

Primeiro dia: de Boa Vista ao Engenho da Serra:
Léguas:4
Quilômetros: 26
Metros: 400

Segundo dia, do Engenho da Serra a Pouco Alto:
Léguas: 5
Quilômetros: 33

Terceiro dia. de Pouso Alto a Caxambu:
Léguas: 5
Quilômetros: 33

Total: Léguas 14
Quilômetros: 92
Metros: 400

                Seguindo-se este itinerário, os pontos mais convenientes para almoço São 1° Palmital; 2° São José do Picú; 3° Alto da Boa Vista.
                Existem duas barreiras entre a Boa Vista e o Engenho da Serra; a primeira, na raiz da Serra do Picú (Província de Minas Gerais). Naquela exige-se a taxa de 100rs por animal de montaria ou carga, incluindo os de liteira e os soltos.

                A estrada desde a Boa Vista até o alto do Picú, não obstante a extensa e íngreme subida da Serra, presta fácil trânsito, graças ao cuidado de sua conservação pela administração provincial do Rio de Janeiro. Mas do Registro do Picú em diante não estará muito longe da verdade quem afirmar que a cada passo nessa descida abrupta e de cerca de 2 léguas (13 quilômetros e 200 metros) encontra o viajante verdadeiros precipícios na estação das chuvas.
                Segundo informações de pessoas fidedignas e até empregados fiscais da província de Minas Gerais, desde 1866 não tem esta estrada recebido o mais insignificante reparo, embora transitem por ali diariamente dezenas de viajantes e muitas centenas de animais de toda a espécie.
                O completo abandono desta estrada utilíssima não pode de certo, ser atribuído à deficiência de fundos nos cofres provinciais de Minas, porquanto consta de documentos oficiais que no quinquênio decorrido de 1° de julho de 1867 a 30 de junho de 1872 e nos três primeiros meses (julho a setembro) do exercício de 1872 a 1873 a importância das taxas arrecadadoras na Recebedoria do Picú atingiu a importância de 624.019$729, sendo muito superior a 100:000$000 a média de cada um dos mencionados anos.

                Não obstante ser princípio conhecido e aceito que o produto das taxas da barreira deve ser aplicado principal senão exclusivamente ao melhoramento da estrada respectiva, a fim  de oferecer mais segurança e cômodo aos viajantes, mais presteza e eficácia às relações comerciais, contudo, não se tem procedido assim com a de que tratamos, cujo rendimento é distraído para outras despesas, deixando-se ao sol e à chuva a conservação de uma das principais artérias, que alimenta a fonte da receita provincial.
                Desde a povoação denominada João Pinto na raiz da Serra do Picú (território Mineiro) a estrada geral, quase plana, atravessando apenas alguns morros de pequena elevação, oferece fácil, cômodo e até agradável trânsito na estação seca, mas na época das chuvas a falta quase total de pontes e pontilhões sobre numerosos ribeirões e córregos que atravessam, torna o trânsito muito difícil senão perigoso.
                Feitos porem os indispensáveis consertos na Serra do Picú e construídas as pontes necessárias, esta estrada dará fácil e segura passagem em qualquer estação do ano, se curar-se eficazmente da sua conservação.


* * * * *
BREVE NOTÍCIA SOBRE A  POVOAÇÃO DE CAXAMBU

                Há em Caxambu quatro hotéis denominados Fonseca, União, Oliva e Nogueira de Sá: o 1° situado na entrada da povoação, ao sul; o 2º na extremidade oposta, e os outros nas proximidades das fontes
                Em todos estes hotéis a mesa é abundante e variada e todo o serviço é feito com regularidade, pagando os hóspedes 3$000 diários e 1$500 por escravo ou fâmulo, não compreendendo nestes preços vinhos e outras bebidas alcoólicas, luzes pra os aposentos, e lavagem de roupa, de que na povoação há quem se encarregue com prontidão e barateza.
                O hotel Fonseca oferece a vantagem de uma redução de 10%, aos hóspedes, que se demoram por mais de 30 dias.
                No hotel União porém encontram-se as melhores, mais vastas e arejadas acomodações.
                Os viajantes sem família lucrarão consideravelmente hospedando-se em hotel, porque as suas despesas limitar-se-ão a 1/3 que teriam de fazer se alugassem casa e a  provessem dos objetos de uso indispensável.

                Contam-se atualmente no povoado 78 casas cobertas de telha, muitas das quais são vastas e cômodas. Seu aluguel regula por 4$000 a 5$000 diários, estando todas alfaiadas com sofás e seis cadeiras de palhinha, dois aparadores para sala, mesa de jantar, um banco e três marquesas.
                As casas menores são alugadas por 2$000 e 3$000 diários, e são poucas as que contém mobília.
                Estes aluguéis são cobrados de Maio ao fim de Novembro, quando há maior afluência de aquáticos (denominação usada na povoação para designar os concorrentes às águas).
                Segundo informações de pessoas residentes  na povoação e em Baependi, não só os aluguéis das casas como o preço dos gêneros alimentícios baixam quase à metade a datar de Dezembro ao fim de Abril.
                Convém aqui notar que, estando hoje beneficiadas as fontes minerais de modo que as enchentes do ribeirão próximo não as invadam, como outrora na estação das chuvas, é por isso possível o uso das águas em qualquer época do ano. Portanto, as pessoas da Corte e de outros lugares, onde os calores de Dezembro a Março são excessivos , e desenvolvem-se epidemias mais ou menos intensas segundo a influência climatológica, devem procurar o uso das águas neste  período, lucrando assim triplamente, pois evitam o excessivo calor predominante na Corte, com especialidade durante estes meses, subtraem-se as condições nocivas de uma atmosfera impregnada de princípios  deletérios, e podem realizar a economia de cerca de 50% da despesa que fariam de Maio a Novembro.
                Pessoa muito competente, não só pela especialidade de seus conhecimentos, mas também pelo estudo e experiência das águas, é de opinião que longe de perderem  alguma parte de sua eficácia na estação chuvosa, não só conservam toda a sua força, como adquirem maior intensidade na aproximação de trovoadas, que promovem maior desenvolvimento dos gases.
                É portanto engano supor-se, como quase geralmente sucede, que a melhor quadra do ano para o uso das águas é a que decorre de Maio a Novembro, porquanto a residência em Caxambu torna-se incômoda durante os meses de Abril a Agosto, por isso que o frio é então quase tão insuportável ali  quanto o é na Corte o calor de Dezembro a Março.
                Esta opinião é corroborada pela prática da Europa, onde o verão é considerado como a época mais conveniente ao uso das águas medicinais.
                Luchon, por exemplo, que no verão apresenta o aspecto de uma cidade muito populosa e cheia de animação, volve no inverno, senão a um deserto, à insignificância de um lugarejo, que apenas conta 1.500 habitantes.
                Há presentemente em Caxambu, botica bem provida de medicamentos, consultório de dentista, loja de barbeiro, oficina de selaria, ferrador, agência do correio, casa de bilhar e outros jogos, padaria e 15 armazéns  onde encontram-se todos os gêneros de secos e molhados e objetos de loja e armarinho, assim como um açougue, onde se talha, três vezes por semana, excelente carne de vaca, carneiro e porco, a primeira das quais é vendida a 100 rs, por libra e a 200 rs as duas últimas.
                Os vinhos, a louça e os vidros são caríssimos, uma medida de vinho inferior custa de 3$200 a 1$000; um copo que vale 500 rs é vendido por 1$200 e 1$500. As meias garrafas custam 160 e 210 a 280 rs  as inteiras. Esta carestia é motivada, sem dúvida, pela despesa de transporte, e pelo grande consumo, que tem, destinando-se elas à exportação das águas medicinais.
                Pelas ruas da povoação mercam-se diariamente em tabuleiros saborosos biscoitos de polvilho, excelentes broinhas de fubá mimoso, pão-de-ló, doces e sequilhos de várias espécies.
                Nos arredores da povoação, e principalmente a 3 ou 4 léguas de distância, há abundância de caça, que consiste em veados, pacas, perdizes, codornas, jacus, pombas, etc.

                O preço regular das aves domésticas, e outros produtos da localidade é o seguinte:

Galinhas de 640 a 1$000.
Frangos de 210 a 500 rs.
Ovos 240 rs a dúzia.
Leite (superior) 80 e 100 rs, a garrafa.
Capado de 5 a 6 arrobas 30$000 a 35$000.

A farinha, o arroz, o milho e o feijão variam de preço segundo o bom ou mau resultado das colheitas. O café e o açúcar são vendidos por preços elevados.
                A melhor ocasião para fazer-se provisão de aves, farinha arroz, café, ovos, queijos e certos gêneros é aos domingos, quando são oferecidos à porta por indivíduos que faz fazendas e situações da circunvizinhança concorrem ao mercado de Caxambu.
                Não residindo na povoação nenhum médico, os habitantes, no caso de necessidade, recorrem a Baependi, a ¾ de léguas (4 quilômetros e 950metros) onde reside o ilustrado Sr.Dr. Manoel Joaquim Pereira de Magalhães, e outros médicos distintos.

                Teve começo em 1871 e foi concluída em 1872, a expensas dos habitantes e dos aquáticos, uma capela sob a invocação de Nossa Senhora dos Remédios, onde celebra-se missa aos domingos pelo Revd. Sr. João José Rodrigues, que é igualmente pago por subscrição anual dos habitantes e dos aquáticos.
                Existem presentemente duas escolas de instrução primária, sendo uma para meninas e outra para meninos pobres. Ambas foram instituídas pelo Dr. Carlos Theodoro de Bustamante, que paga os vencimentos dos professores. A primeira destas aulas foi inaugurada em 16 de Agosto de 1870. A professora é obrigada a matricular e a ensinar até seis discípulas, vencendo o dispêndio mensal de 20$000, com liberdade de receber qualquer outras discípulas mediante a retribuição mensal de 2$500 por alunas, pagos pelos respectivos pais.
                A aula para o sexo masculino entrou em exercício em 4 de Novembro de 1872. É o professor obrigado a matricular e a ensinar 12 discípulos, vencendo a gratificação anual de 300$000, podendo usar da faculdade permitida à professora.
                Até 9 de Setembro de 1873 existiam matriculados 50 alunos, alguns dos quais apresentavam notável adiantamento, sobretudo em caligrafia e leitura.
                Conta hoje a povoação cerca de 170 habitantes, não incluindo os residentes temporários, e os moradores das circunvizinhanças em não pequeno número.
                Como sê da planta junta,  a povoação de Caxambu é situada em um vale assente pela maior parte, senão na totalidade, sobre um banco de turfa.
                A situação, posto que contornada por altas montanhas, entre as quais avulta majestoso o Morro do Caxambu, cuja elevação é calculada em 200 metros, de graciosa forma cônica, em cujas encostas cobertas da mais opulenta vegetação crescem inúmeros arbustos que produzem frutas as mais saborosas e odoríferas, encerra em si as mais encantadoras paisagens.
                Do alto dessa eminência, alcatifada de flores silvestres das mais lindas e variegadas cores em grande abundância, o espectador extasiado descortina o panorama de indescritível beleza que, em todas as direções, abrange a distância de 6 a 7 léguas.
                Dir-se-á que esta montanha foi colocada ali pela mão do Onipotente, qual sentinela gigante, para indicar ao viajante longínquo o depósito precioso das águas maravilhosas que emanam das suas entranhas.
                Apresenta aquela perspectiva tantas e tão fascinadoras cenas aos olhos do espectador entusiasmado , que é possível imaginar outras, que mais suaves e deleitosas condições lhe possam infundir.
                A povoação é acessível por dois caminhos formados pela bifurcação da estrada geral do Picú, que a uma légua (6 quilômetros e 600 metros) mais ou menos da cidade de Baependi, divide-se em dois ramos, um a estrada geral, que continua no rumo E, conduz para a cidade, o outro, que em direção oblíqua, vai diretamente a Caxambu, situado a O de Baependi.
                É por este caminho que ordinariamente entra-se naquela povoação, evitando-se assim o rodeio de ¾ léguas (4 Quilômetros e 950 metros que se teria de fazer passando pela estrada de Baependi.

* * * * *
ESBOÇO HISTÓRICO DAS ÁGUAS MEDICINAIS DE CAXAMBU


                Segundo a tradição corroborada pelo testemunho de anciães respeitáveis, moradores em Baependi e em Caxambu, data de 1814 a descoberta destas águas por dois campeiros da antiga fazenda de D. Luiza Francisca de Sampaio.
                Andando em busca de alguns animais fugidos da fazenda, os referidos campeiros foram ter ocasionalmente ao lugar, onde hoje existem as fontes minerais, e que então era um vasto e perigoso tremedal literalmente coberto de mata virgem. Convencidos da impossibilidade de penetrarem mais avante na mata, os dois campeiros retrocederam do ponto, a que haviam conseguido chegar com trabalho inaudito e até com perigo de vida; e foi então que na sua passagem notaram que na fralda da montanha , hoje denominada Morro do Caxambu,brotava uma pequena fonte, a qual na frase dos mesmos, férrea.
                Admirados de semelhante prodígio, e ao mesmo tempo movidos de curiosidade, provaram a água, cujo sabor lhes pareceu horrível!
                De volta à fazenda referiram o fato a sua senhora em presença de um naturalista estrangeiro (se foi em 1814 que um naturalista estrangeiro, por dizer do povo de Baependi, examinou as águas minerais de Caxambu, esse naturalista deveria ter sido ou o Barão von Eschwege, ou  Langsdorff, pois que Saint Hilaire, Spix, Martius, príncipe  Maximiliano, Lund e outras suposições neste particular, vieram ao Brasil depois  daquele fato)que ali se achava hospedado, o qual, tendo-se feito conduzir ao lugar, onde examinou a água, declarou à proprietária da fazenda que aquela fonte era uma preciosidade inestimável, por ser água férrea de excelente qualidade a que emanava, e como tal remédio poderosíssimo contra opilação e outras enfermidades.
                Divulgou-se rapidamente a notícia do precioso achado,  e pouco tempo depois começavam a afluir ao lugar diversas pessoas opiladas, as quais, tendo obtido resultados prodigiosos do uso interno e externo das águas, deram-lhes o nome de “Águas do Caxambu.
                Conhecidas as virtudes medicinais destas águas, desenvolveu-se rapidamente extraordinária concorrência de doentes, afluindo igualmente de diferentes localidades da província de S.Paulo crescido o número de morféticos, cuja presença, posto fossem expulsos pelas autoridades de Baependi pouco tempo depois da sua chegada, motivou o descrédito das águas e o seu consequente abandono até 1844. Cumpre notar que, não obstante a vulgarização das numerosas e admiráveis curas, conseguidas pelo simples uso das águas, reinou até aquele ano a mais completa ignorância dos verdadeiros pontos da sua nascença.
                Em uma memória, escrita em 1868, afirmou o finado Felício Germano de Oliveira Mafra ter sido ele quem, após longa série dos mais árduos e perseverantes trabalhos embaraçados a cada passo não só pelas dificuldades e perigos que oferecia o vasto e profundo tremedal, que cobria todo o terreno, mas também pela falta de meios pecuniários, descobriu em fins de 1844 a nascente de uma fonte gasosa, que desapareceu pouco tempo depois, por ter sido obstruída com grande quantidade de cascalho, lançado por pessoas malévolas.
                Felizmente, porém, esta perda, por sem dúvida muito sensível, foi compensada pouco depois com o descobrimento sucessivo de outras fontes minerais, que ele beneficiou, fazendo algumas obras que, posto fossem insuficientes, defeituosas e em alguns casos até inconvenientes, em consequência , sem dúvida, de não haver precedido à sua construção o necessário estado científico, e nem terem sido realizadas sob uma administração técnica, assim permaneceram até 1867, quando já as águas eram procuradas por considerável número de enfermos, que para ali afluíam em busca de alívio a seus sofrimentos, atraídos pela notícia das curas prodigiosas, que os primeiros concorrentes às águas haviam obtidos.
                A câmara municipal de Baependi, solícita em promover o bem estar dos seus municípios, e animada dos mais louváveis sentimentos em prol da humanidade, dirigiu-se em 16 de Outubro de 1856, ao governo provincial informando-o do aumento progressivo do número de enfermos, que iam pedir às fontes medicinais lenitivo a seus padecimentos, e enviando-lhe ao mesmo tempo o extrato das observações, que sobre as águas havia feito o ilustrado Sr. Dr. Manoel Joaquim Pereira de Magalhães, cujo resultado é o seguinte:

Ácido carbônico livre, em abundância.
Carbonato de ferro, em abundância.
Carbonatos alcalinos.
Nitrato de potassa.
Hidroclorato de ferro
e talvez
Hidroclorato de potassa, etc.
Sendo por isso úteis nas
Cloroses
Acidentes nervosos
Gastralgias
Amenorréias
Astenias
Caquexias
Hidropsias
Engorgitamentos viscerais
Febres intermitentes
Escrófulas
Leucorréias
Blenorragias

Assim como contra a
Esterilidade.
               
Dez anos antes já o finado conselheiro Dr. Francisco de Paula Conceição havia analisado a fonte de águas férreas, verificando:

§ 1°- 1° Ácido carbônico em dissolução.
2°-Abundante quantidade de  carbonato
de ferro.
3° Cloridato de sódio.
§ 2°-1° Ácido carbônico em dissolução.
2° Pequena quantidade de cloreto de sódio.
               
Por essa condição representou também a referida Câmara sobre a necessidade de serem desapropriados os terrenos generativos das águas, a fim de se prepararem as comodidades indispensáveis ao grande número de pessoas, que recorriam normalmente.

                A Assembléia legislativa da província, atendendo a esta requisição, consignou na lei n°1104, de 16 de Outubro de 1861, art. 23, a quantia de 4:000$000 para a desapropriação dos terrenos adjacentes ao poço.
                Em 1866 foi efetuada a desapropriação por ordem do Se. Joaquim José de Santa Anna que então administrava a província, como seu vice-presidente.
                Parece que ao votarem os fundos para a desapropriação não atendeu-se convenientemente à comodidade pública, nem cogitou-se do incremento que a localidade teria necessariamente à vista da variedade e excelência das águas minerais, da amenidade do clima e da beleza da situação.
                A área compreendida no polígono que representa o terreno desapropriado, além de não incluir os verdadeiros terrenos generativos das águas minerais (o morro de Caxambu) mede apenas 181.780 metros quadrados (aproximadamente 99,543 braças quadradas ou equivalente a uma área, mais ou menos, de 0,01 da légua quadrada), dos quais deduzem-se diversas áreas reservadas (veja a planta anexa) restando assim um espaço tão acanhado que, sendo o seu perímetro menor do que o de algumas chácaras particulares, nem a edificação poderá desenvolver-se nas convenientes proporções, nem os habitantes gozam de certas comodidades indispensáveis.
                A falta de logradouros públicos, por exemplo, sujeita-os  à imposição operosa de 100 rs diários por animal no único pasto sofrível de propriedade particular, que há na vizinhança do povoado. Se não receássemos incorrer na pena de temerários, à vista da nossa incompetência, sustentaríamos que, ao decretar-se a desapropriação dos terrenos generativos das águas, era de absoluta necessidade atender as circunstâncias acima especificadas e a outras considerações óbvias, alargando-se a área cujos limites, nos parece, deveriam ser uma linha tirada da confluência do ribeirão João Pedro com o do Tavares ou Bengo pela margem esquerda deste até defronte da praça n° 100, subindo até a porteira C, donde seguiria na direção 154°N para O, até defrontar com a grota que separa os morros do Caxambu e da Cruz a 185 metros da dita porteira. Deste ponto subiria pela mesma grota no rumo N.42° para O, a encontrar com um pequeno córrego que jaz por detrás do morro do Caxambu, e tomando aí a direção N. E. para S. O., iria encontrar o córrego “Água comprida”, ou antes se prolongaria 350 metros na mesma direção. Seguiria daqui, no rumo N.O. para S.E., até o ponto que, na direção S.O. para N.E. fosse confrontante com a nascente de um pequeno córrego situado entre a velha Fazenda do Caxambu e a povoação. Deste ponto assim determinado, tomaria esta última direção até encontrar o ribeirão João Pedro, cuja margem direita acompanharia até o ponto de partida, abrangendo assim uma área com capacidade para edificar-se uma cidade regular e cômoda. Mas  ousamos crer que, se para competente e mais autorizada do que a nossa prestar-se a elucidar este ponto, será reparado o erro, ou antes a imprevidência primitiva, reconsiderando-se os limites atuais, e removendo-os para os pontos acima indicados, ou para outros, que ofereçam igual, senão maior soma de vantagens aos habitantes e espaços suficientes para o incremento da povoação.
                Protestam contra a insignificância da área desapropriada o conhecimento prático das circunstâncias peculiares da capacidade; o aumento tão rápido quanto notável realizado nos  últimos quatro anos, assim na população como na edificação, e o futuro brilhante de Caxambu, quando construir se, senão o já estudado ramal que, partindo da estação de Queluz, na estrada de ferro D.Pedro II e transpondo a serra do Picú no lugar denominado “Passa Quatro”, ligue aquela povoação à Corte, ao menos uma boa estrada de rodagem que preencha o mesmo fim.
                Verificada a desapropriação, e dispondo a Lei mineira n° 1267 (art.13) que o terreno desapropriado fosse dividido em lotes para serem aforados, o Sr. conselheiro Joaquim Saldanha Marinho, solícito em promover melhoramento material e o bem-estar da província, então confiada à sua ilustrada administração, deu cumprimento a esta Lei, fazendo medir, demarcar e dividir o terreno em lotes de diversas dimensões, como se vê da planta anexa, e ordenou ao mesmo tempo o preparo do cálculo indispensável para o aforamento, sob cujas bases determinou à câmara municipal de Baependi que a ele procedesse.
                Aguardando o plano e a planta do estabelecimento balneário, assim como o respectivo orçamento de que havia incumbido o engenheiro Horta Barbosa, sem dúvida para autorizar a construção das obras, deixou aquele conselheiro a administração da província, na qual foi substituído pelo Sr. Dr. José Machado da Costa, o qual não menos solícito pelo progresso da província, reiterou em 19 de Novembro do mesmo ano a ordem anteriormente dada para o levantamento do plano e preparo do orçamento a fim de construir-se o estabelecimento balneário. Estes trabalhos, também cometidos ao referido engenheiro, foram por ele apresentados em Fevereiro de 1868, e serviram de norma à construção do atual edifício balneário, que contém seis banheiras fornecidas de água gasosa que, sendo extraída da fonte D Pedro com o auxílio de uma bomba de alta pressão, é levada por longo encanamento de chumbo ao ferro.
                Além daquele estabelecimento, construíram-se seis pequenos chalets que resguardam igual número de fontes minerais, hoje beneficiadas de modo que as águas podem ser utilizadas em qualquer estação do ano.
                No intuito de obstar as invasões do ribeirão Tavares ou Bengo, em cujas margens está situada a maior parte das fontes, e que as inutilizava na época das chuvas, foi o mesmo ribeirão canalizado de maneira que as maiores enchentes não têm podido atingi-las.
                As fontes beneficiadas são hoje conhecidas pelo nomes:

Na margem esquerda do Ribeirão
1ª  Fonte D.Pedro
2ª  Fonte D. Thereza
3ª  Fonte Duque de Saxe
4ª  Fonte D. Leopoldina

Na margem esquerda
5ª  Fonte Conde d´Eu
6ª  Fonte D. Isabel

                Além destas, existem três fontes minerais que, tendo surgido posteriormente, ainda não foram beneficiadas.
                No leito do ribeirão Tavares ou Bengo brotam em diferentes pontos jatos de água muito límpida em forma de bolhas que se desfazem ao chegarem à superfície.
                Não tendo ainda sido examinadas estas águas, ignora-se a sua verdadeira natureza, havendo apenas a suposição de serem gasosas.
                A 90 metros da povoação no lado esquerdo do caminho da Glória existe em terreno do Dr. Carlos Theodoro Bustamante, e por ele cedido gratuitamente à província, uma fonte que se diz ser sulfurosa ou termal, sobre a qual construíram-se duas banheiras de madeira. Esta fonte, talvez a mais proveitosa, e efetivamente a mais abundante é de pouca ou nenhuma utilidade, não sé porque a inutilizam as águas superabundantes, que a falta de esgotos estagnam junto da fonte, como por estar a descoberto, e ao alcance das vistas dos transeuntes.
                A utilidade das águas desta fonte para banhos não pode ser posta em dúvida, se são realmente sulfurosas ou termais. Será conveniente proceder-se a uma análise e se o resultado confirmar a opinião que se forma da sua composição e propriedades, pô-las em condições de serem utilizadas. Parece que nesse intuito deve-se antes de tudo, canalizar o ribeirão, cujas águas alagam a área do terreno onde existe a fonte, e depois construir tanques ou banheiras, de modo, porém, a não ser preciso elevar a água por meio de bombas, o que agitaria e lhe faria perder, na opinião de alguns químicos, parte das virtudes terapêuticas, que por ventura possuam.
                Parece que fora de vantagem assentar as banheiras colocando os fundos em nível inferior à superfície do terreno onde surgem as águas da fonte, e da maneira que se encham sem o auxílio de bombas.
                Consta-nos que na Europa, em muitos lugares de águas minerais, assim têm sido dispostas as banheiras.
                Informaram-nos também que nas águas do Lambari, na Campanha, os poços antigos tinham os fundos muito inferiores à superfície do terreno circunvizinho, e que a ação fisiológica de suas águas era maior do que atualmente, depois que se fizeram obras no pensamento de beneficiá-las, e se construíram banheiras, que se enchem por meio de bombas.

                Parece racional que no tratamento de águas, e sobretudo das minerais, deva haver a maior prudência e critério, e segundo lemos algures, a prova que um engenheiro pode dar de sua perícia, é não perturbar o que foi disposto pela natureza.
                Asseguram-nos que uma fonte do Lambari tem atualmente suas águas menos ricas de princípios minerais em consequência de se haver pretendido aumentar o seu volume.
                Leigos totalmente em matéria de trabalhos hidrológicos, as idéias que acabamos de externar, são o resultado do que observamos com interesse, do que lemos e do que ouvimos de pessoas que consideramos habilitadas para emitir uma opinião, com especialidade do distinto engenheiro Dr. Alonso Limpo de Abreu, de muita saudosa memória, o qual, durante sua estada em Caxambu em 1869, examinou cuidadosamente as fontes e mais obras.
                Relevem-se, pois, as palavras por nós aqui articuladas em assunto, em que, repetimos, somos inteiramente leigos. Fale porém quem competente é; falem os médicos que por vezes tem estado naquela localidade, e que por amor da humanidade e da ciência alguma coisa devem escrever a este respeito.

                Segundo os exames, que nas fontes beneficiadas fez o ilustrado Sr. Barão de Santa Izabel, em 1868, a natureza química e as aplicações terapêuticas das águas são:

Fonte D. Pedro – Água muito gasosa e pouca alcalina nas:
Dispepsias e sofrimentos crônicos dos intesti-
nos e estômago, assim como em banhos.

Fonte D. Thereza – Gasosa, ligeiramente férrea.
Indicada nas:
Obstruções das vísceras.
Opilações.
Cloroses.
Flores brancas.
Falta de regras.

Fonte Duque de Saxe- Muito sulfurosa e fracamen-
te gasosa. Indicada nas:
Lesões crônicas do útero e ovários.
Sofrimentos da bexiga.
Incômodos hemorrodários.
Leucorréias.
Perturbação da menstruação.
Moléstias da pele.
Sífilis.

Fonte D. Leopoldina – Água magnesiana gasosa.
Indicada nos:
Sofrimentos crônicos dos intestinos.
Constipação do ventre com especialidade.

Fonte Conde d´Eu – Água pouco gasosa e  muito
férrea. Indicada nas:
Anemias.
Opilações antigas.
N.B. Esta água deve ser tomada em pequenas quantidades por ser muito rica de ferro.

Fonte D. Izabel – Água pouco gasosa, ligeiramente férrea e sulfurosa. Indicada nos:
Sofrimentos crônicos do fígado e baço.
Clorose.
Histerismos.
Acidentes nervosos.

                À vista da excelência e da variedade de águas medicinais, reunidas em um perímetro de poucas braças de extensão, torna-se evidente a prodigalidade com que a Providência esmerou-se em enriquecer aquela localidade que, sem exageração, pode ser denominada Tesouro de saúde. Infelizmente, este tesouro, que em outro país teria sido aproveitado com avidez logo após o seu descobrimento, e daria nascimento instantâneo a uma cidade esplêndida e dotada de todas as comodidades imagináveis, este dom magnífico e completo como são todos os liberalizados pela mão do Criador, jaz ignorado e desprezado por largos anos.

                E conquanto o governo provincial de Minas já tenha feito alguma coisa em benefício das águas, e sejam estas procuradas por centenares de enfermos, que afluem constantemente de diferentes partes do Império, é sobremodo doloroso confessar que, a continuar o estado de abandono e o desleixo, em que se tem deixado aquela importantíssima localidade, desaparecerão em breve os melhoramentos realizados, que custaram à província 27:000$000.
                O edifício balneário ameaça ruína; as banheiras nenhuma utilidade têm prestado, porque a bomba, que extrai a água da fonte, existe inutilizada desde 1870; as valas de esgoto das fontes minerais conservaram-se totalmente obstruídas até 1869, quando foram desentupidas, graças unicamente à liberalidade dos concorrentes às águas, que também fizeram reparar as estradas a expensas suas; nas proximidades das fontes existe um vasto e profundo tremedal que, a não ser a excelência do clima, seria um foco de perenes epidemias.
                Julgamos de rigorosa justiça consignar aqui que alguns dos melhoramentos que hoje se notam na povoação, como sejam abertura e limpeza das ruas e valetas, arborização, etc., são devidos exclusivamente à generosidade de alguns concorrentes às águas, e com especialidade, dos Srs. Drs. Caetano Furquim de Almeida, José Caetano de Almeida e Joaquim José Teixeira Leite, de saudosa memória.
                Este estado de coisas é devido sem dúvida à falta de meios pecuniários nos cofres da municipalidade de Baependi, a cujo cargo estão as fontes. A receita municipal, insignificante como é, não pode por certo comportar as despesas necessárias para a conservação das fontes e obras, para o aformoseamento e limpeza da povoação, e para o reparo das estradas.
                À vista deste quadro contristador, mas esboçado com cores infelizmente verdadeiras, não é da primeira intuição que, sendo hoje fato incontrastável que as águas minerais são um meio poderoso de curativo em grande número de moléstias, rebeldes a qualquer outro tratamento, e estando provado até a evidência não só pela estatística oficial anexa sob n°2, como por centenares de exemplos, que as águas minerais de Caxambu encerram em si poderosíssimas virtudes medicinais, não é de primeira intuição, dizemos, que, longe de serem votadas ao abandono, cumpre que se cure a todo custo do seu melhoramento desde que tanto interessam à saúde pública?
                Foi em atenção a todas estas circunstâncias, sem dúvida, que o governo provincial de Minas celebrou, em 8 de Março de 1873, um contrato  com Srs. Visconde de Lages, Dr. Antonio Pereira Pinto e José Manoel Alves Meirelles, para a construção de um novo estabelecimento balneário, mediante indenização das despesas feitas com o estabelecimento atual; mas, não será mais conveniente, não será até dever do governo imperial chamar a si por meio de desapropriação, por incontestável utilidade pública, a posse daquele estabelecimento e dos terrenos adjacentes, depois de verificadas as necessárias análises qualitativas e  quantitativas das águas, a fim de curar eficazmente de sua conservação, fazendo erigir um estabelecimento dotado de todos os melhoramentos aconselhados pela ciência, e que no futuro será mais uma fonte de receita para o Estado?
                A razão e o bom senso parecem responder afirmativamente; mas não nos julgando habilitados para discutir a questão, limitamo-nos a aventá-la, bem convencidos de que os poderes competentes do Estado, reconhecendo a magnitude do assunto, o resolverão em proveito da saúde pública.

                Caxambu, 12 de Setembro de 1873

* * * * *


ANEXO N° 1


Cópia Fiel


                Examinando a fonte de água férrea sulfurosa, existente nesta situação (Engenho da Serra), reconheci nela o gás ácido Carbônico, parte carbonato de ferro e o ácido hidrosulfúrico.
                O cheiro dos ovos podres não é muito sensível ao olfato, como acontece com as águas termais de Caldas; mas ele comunica ao paladar o sabor pronunciado dos ovos chocos.
                Além disto a presença do ferro torna-se saliente pelo sabor estíptico, que apresenta, mineralizando-a.
                Depositada por algum tempo, nota-se o desprendimento do ácido carbônico, que fica aderente ao vaso e, forma de pequenas bolhas, o que igualmente se vê nas águas virtuosas da Campanha.
                Esta água é de grande proveito nas moléstias uterinas, nas menstruações difíceis, etc., devem porém ser tomadas com método.
                Nas moléstias do fígado são também preconizadas, sendo igualmente tomadas com prudência.
                Sou da opinião que convém conservar a fonte no seu estado primitivo. Qualquer melhoramento pede deteriorá-la.

Em 4 de Dezembro de 1868. Dr. Barboza da Veiga