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quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

Queda de arrecadação
LRF é um martírio para prefeitos em fim de mandato


Cumprir a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) pode ser um desafio inalcançável para muitos prefeitos em fim de mandato. O ponto principal do possível descumprimento da LRF é a queda de arrecadação municipal, impulsionada sobretudo pela redução do IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados), que é repartido entre os entes federativos.
De acordo com pesquisa recente da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), aproximadamente 2 mil prefeituras correm o risco de fechar no vermelho, sem dinheiro em caixa, e assim transferir dívidas ao mandato seguinte.
Não é por outra razão que os governantes pedem socorro financeiro à presidente Dilma. O governo federal, por sua vez, estuda algum tipo de compensação para os municípios que estão nestas condições.
A Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) ou Lei Complementar 101 de 4 de maio de 2000 consolidou-se como um importante instrumento de disciplina orçamentária, equilíbrio fiscal e planejamento e controle de despesas públicas. É um avanço nos sistemas financeiros, fazendário e do planejamento público.
Por outro lado, a irresponsabilidade fiscal tornou-se crime no país, cuja pena pode chegar a quatro anos de prisão e multa de 30% do salário, e obrigou os governantes a seguirem à risca os preceitos da lei, o que acarretou em uma mudança de postura do gestor público.
Mas com o término dos mandatos de prefeitos no Brasil em 2012, cumprir a LRF sem que haja prejuízo ao erário e aos serviços públicos pode ser mais complicado do que parece. Um artigo em particular, o 42, é um dos pontos principais que podem levar os governantes municipais, em fim de mandato, a cometerem algumas atitudes desmedidas.
O artigo 42 da Lei de Responsabilidade Fiscal diz que “é vedado ao titular do Poder Público, nos últimos dois quadrimestres do seu mandato, contrair obrigação de despesa que não possa ser cumprida integralmente dentro dele, ou que tenha parcelas a serem pagas no exercício seguinte sem que haja suficiente disponibilidade de caixa para este efeito.”
Neste ponto, é preciso entender o que significa obrigação de despesa. Muitos prefeitos entendem que não podem manter contratos de serviços públicos com prazos de execução e pagamentos que extrapolam o período de mandato. O que acontece nestes casos é o cancelamento destes contratos ou a vigência até o último dia de governo.
Com isso, o próximo governante recebe a prefeitura com a paralisação do serviço prestado. Muitas vezes, isso ocorre quando não há disponibilidade de recursos para o próximo ano. Ou então quando há queda de arrecadação ao longo dos anos, que pode acontecer por crises econômicas ou desoneração fiscal, que é o caso do IPI. Quando cai a produtividade em um determinado município, automaticamente menos impostos são recolhidos, um cenário muito comum nas cidades brasileiras. Assim, uma previsão de gasto não poderá ser cumprida.
Entretanto, obrigação de despesa acontece quando o serviço é executado ou o produto é fornecido. É diferente da obrigação contratual, onde a lei não proíbe executar acordos contratuais em mudanças de mandato, mesmo quando há cronograma de pagamentos.
Mas por não entender o que realmente a lei permite ou não, o prefeito acaba por optar pelo cancelamento de contratos. E justamente para não paralisar serviços essenciais como coleta de lixo, fornecimento de medicamentos e transporte público, por exemplo, é que a legislação prevê que contratos públicos podem ser herdados por novos governantes.
De qualquer forma, há dois mecanismos na LRF criados para evitar o cancelamento total do serviços ou a transferência de dívidas para outro mandato. Um deles é a possibilidade de redução do contrato. O governante pode reduzir unilateralmente o acordo contratual em até 25% do montante, e de forma bilateral sem limites de valores, o que pode ser uma saída viável para evitar o endividamento.
Também pode-se suspender temporariamente o contrato, desde que se leve em conta a necessidade primária do serviço prestado. Uma paralisação temporária pode ser uma solução razoável até que o município tenha novamente recursos disponíveis e, assim, possa retomar o serviço prestado.
Portanto, antes de tomar uma atitude drástica, como parar um serviço essencial ou deixar dívidas para seu sucessor, o prefeito precisa usar todas as prerrogativas legais para manter sua gestão com saúde fiscal e ao mesmo tempo funcional em termos de demandas da população.
A Lei de Responsabilidade Fiscal foi um dos alicerces que segurou o Brasil no tumulto da crise econômico-financeira do segundo semestre de 2008. Trata-se de uma ferramental importante para preservar a disciplina fiscal, mesmo em períodos de turbulências macroeconômicas, quando a política fiscal deve ser expansionista, mas sempre executada de forma coordenada com a política monetária. É fundamental para pagar precatórios e oferecer continuamente serviços básicos e de infraestrutura no país.
Thúlio Caminhoto Nassa é membro da Comissão de Direito Administrativo da OAB-SP e professor de Direito Administrativo da pós-graduação da PUC-SP (COGEAE/SP). Mestre e Especialista em Direito Administrativo pela PUC-SP.
 Fonte: Revista Consultor Jurídico, 13 de dezembro de 2012